Dados do Banco Central mostram que as bets devem movimentar R$ 240 bilhões no período de um ano, enquanto os investimentos totais em projetos de inovação devem ficar na faixa de R$ 110 bilhões, segundo estimativas do economista Marcos Troyjo, ex-presidente do Banco dos Brics e criador do BRICLab na Universidade de Columbia. Esse cenário exige uma reflexão profunda sobre nossas prioridades enquanto nação e sobre as implicações desse desbalanceamento para o futuro do país.
A inovação é a espinha dorsal de qualquer economia competitiva. Países que lideram o cenário global, como os Estados Unidos, Alemanha e China, estão na vanguarda do desenvolvimento tecnológico e científico. Eles investem em educação de qualidade e fomentam a pesquisa com incentivos fiscais, subvenções e programas de financiamento robustos.
No Brasil, porém, enfrentamos um paradoxo: temos iniciativas como a Lei do Bem e o Programa Mais Inovação Brasil, que oferecem incentivos fiscais e linhas de financiamento para empresas que investem em P,D&I. No entanto, o alcance desses mecanismos ainda é subutilizado por grande parte do setor privado. Um dos motivos para isso, é a falta de cultura de inovação, que permeia tanto o ambiente empresarial quanto o acadêmico.
Muitas empresas, contudo, ainda não estão aptas a aproveitar os benefícios fiscais e as oportunidades de financiamento devido à ausência de competências organizacionais para inovação. Essa falta de preparo também é destacada em dados apresentados pela Fiesp, que mostram que 63% das empresas afirmam investir em inovação – um percentual baixo no cenário atual – mas 83% delas não utilizam os incentivos fiscais disponíveis, como o da Lei do Bem.
A subutilização desses benefícios está relacionada a diversos fatores, que vão desde falta de informação sobre os mecanismos fiscais até à insegurança jurídica. As avaliações mais recentes dos formulários da Lei do Bem para os anos de 2020 e 2021 pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) têm gerado preocupações, visto que as exigências estão cada vez maiores e a clareza nos critérios de elegibilidade nem sempre é garantida, sobretudo por avaliarem com “novos” critérios projetos que foram submetidos há 3 ou 4 anos, num período em que as exigências do MCTI eram distintas. Este fato aumenta a insegurança das empresas, sobretudo as que optam por realizar o processo por conta própria, fazendo com que muitas empresas reduzam a quantidade de projetos apresentados, ou mesmo abdiquem de tomar esses benefícios fiscais.
Diante destes desafios, as empresas que realmente desejam crescer de forma sustentável e aumentar sua competitividade precisam entender que o investimento em P,D&I não é um custo, mas uma alavanca estratégica. Por isso, é fundamental que o setor privado atue de forma mais proativa no uso dos incentivos fiscais disponíveis e o setor público tenha como dever ampliar e facilitar o acesso a esses instrumentos. Outra medida mais do que urgente, é que as empresas que buscarem implementar processos de P,D&I bem estruturados, fortaleçam parcerias com universidades e centros de pesquisa, criando um ecossistema de inovação robusto.
Além disso, se o Brasil quiser construir um futuro mais competitivo e inovador, precisará considerar aumentar os investimentos em educação, especialmente nas áreas de ciências, tecnologia, engenharia e matemática (STEM). Precisamos fortalecer nossos sistemas educacionais, garantindo que os jovens brasileiros tenham acesso a um ensino de qualidade, que os prepare para enfrentar os desafios do futuro. Países que investem em educação robusta colhem frutos significativos em termos de inovação, formando engenheiros, cientistas e pesquisadores que fazem a diferença no desenvolvimento de tecnologias disruptivas.
Não se pode compactuar com o desvio de prioridades. A situação atual de investimentos em apostas não é apenas uma questão de economia ou problema individual de quem desembolsa dinheiro em bets on-line, mas uma escolha sobre o tipo de país desejamos ser.
*Por Rodrigo Miranda, CEO da G.A.C. Brasil.